Em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 994), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou a tese de que “os valores de ICMS não integram a base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB), instituída pela Medida Provisória 540/2011, convertida na Lei 12.546/2011”.
Três recursos foram tomados como representativos da controvérsia, sendo dois da Fazenda Nacional (REsp 1.624.297 e REsp 1.629.001). Neles, o órgão federal alegou que o valor do imposto estadual integra o preço cobrado dos consumidores, devendo compor a receita bruta, sendo irrelevante o fato de o ICMS ser destinado aos cofres públicos estaduais. Segundo a recorrente, a Lei 12.546/2011 exclui da base de cálculo o montante do ICMS apenas nas hipóteses em que o vendedor dos bens ou o prestador de serviços seja substituto tributário.
O terceiro recurso – REsp 1.638.772 – foi interposto por uma indústria têxtil e teve origem em mandado de segurança no qual ela alegou a inconstitucionalidade e a ilegalidade da inclusão do imposto na base de cálculo da CPRB. O juízo de primeiro grau concedeu a segurança, mas a apelação da Fazenda Nacional foi provida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que entendeu que o ICMS integra o preço final da mercadoria, compondo o valor cobrado do consumidor.
Ao STJ, a recorrente afirmou que as receitas passíveis de serem enquadradas na base de cálculo da contribuição somente poderiam ser aquelas que aderem definitivamente ao patrimônio, não podendo o ICMS – que é integralmente repassado ao fisco – ser considerado receita. Argumentou ainda que as alíquotas do imposto variam entre os estados e que a sua inclusão na base de cálculo afronta o artigo 10 do Código Tributário Nacional.
Contexto
A relatora dos recursos, ministra Regina Helena Costa, explicou que a Medida Provisória 540/2011 normatizou um amplo espectro de providências legislativas, denominado “Plano Brasil Maior”, cujo objetivo foi estimular o desenvolvimento e promover o reaquecimento da economia nacional.
Citando a exposição de motivos da MP, a ministra destacou que um dos instrumentos dessa política foi a CPRB, voltada para a desoneração da folha de salários, ao substituir a remuneração paga aos segurados empregados, avulsos e contribuintes individuais contratados pela receita bruta como base de cálculo da contribuição previdenciária devida pelas empresas que atuassem nos setores contemplados.
Semelhança axiológica
De acordo com a relatora, a controvérsia tem semelhança com o caso julgado no Recurso Extraordinário 574.706, no qual o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional a inclusão do ICMS nas bases de cálculo do PIS e da Cofins.
“Entendeu o plenário da corte, por maioria, que o valor do ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, constituindo mero ingresso de caixa, cujo destino final são os cofres públicos”, esclareceu a ministra.
Regina Helena Costa ressaltou que “à acepção de receita atrela-se o requisito da definitividade, motivo pelo qual, consoante pontuado pelo ministro Marco Aurélio, no voto proferido, o contribuinte não fatura e não tem, como receita bruta, tributo, ou seja, o ICMS”.
Para ela, a posição defendida pela Fazenda Nacional conflita com o entendimento firmado pelo STF. “Note-se que, pela lógica do raciocínio abraçada no precedente vinculante, a inclusão do ICMS na base de cálculo de contribuição instituída no contexto de incentivo fiscal não teria, com ainda mais razão, o condão de integrar a base de cálculo de outro tributo, como quer a União em relação à CPRB, porque, uma vez mais, não representa receita do contribuinte”, afirmou.
A relatora observou que o STF já expandiu seu entendimento para as demandas envolvendo a inclusão do ICMS na base de cálculo da CPRB, assim como as turmas de direito público do STJ, que têm adotado as razões de decidir do recurso extraordinário para afastar a pretensão de alargar a base de cálculo da CPRB mediante a inserção de valores de ICMS.
Substituição tributária
Em relação ao argumento da Fazenda Nacional de que a Lei 12.546/2011 exclui da base de cálculo o montante do ICMS apenas nas hipóteses em que o vendedor dos bens ou o prestador de serviços seja substituto tributário, a ministra ressaltou que “tal entendimento ressente-se de previsão legal específica”.
“Isso porque, para o fisco, a lei, ao prever a não inclusão do ICMS na base de cálculo da CPRB para o substituto tributário, estaria a autorizar, automaticamente, a sua inclusão em todas as demais hipóteses, em interpretação equivocada, com a devida vênia, que olvida a necessidade de norma expressa para a fixação da base de cálculo, em consonância com o princípio da legalidade tributária”, explicou.